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Prefácio de ALEISTER CROWLEY, por Richard Kaczynski

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PREFÁCIO de ALEISTER CROWLEY

por Richard Kaczynski
Ilustrações: Cenas de ALEISTER CROWLEY

Dizem que você jamais se esquece do primeiro amor. O meu foram os gibis.

Lembro vividamente do primeiro que minha mãe me comprou, quando eu tinha cinco anos. Foi um da Marvel: Mighty Thor número 165. Abençoada seja sua alma, ela não tinha ideia do que estava desencadeando. Dizer que fiquei encantado é pouco. Aquele foi o primeiro de mais de 5 mil gibis que eu viria a colecionar pelas próximas décadas. Fosse mitologia nórdica ou o mundo igualmente mítico dos super-heróis, eu amava tudo sobre ambos.

Em retrospecto, imagino que colecionar quadrinhos me treinou cedo para ser um pesquisador. Como amante de quadrinhos, registrei listas completas de meus títulos favoritos, obcecado com quem havia dito o que ou o que havia acontecido em edições anteriores há muito tempo e fanaticamente preservei cada nova compra em perfeitas condições. Faço muito do mesmo agora como pesquisador e historiador de ocultismo ocidental: sou obcecado, buscando obstinadamente cada pista em minha busca pela verdade completa, e fielmente preservando os frutos de minha jornada em saquinhos de plástico filme protetor.

Imagine então minha surpresa e meu deleite ao receber uma carta de apresentação de Martin Hayes explicando que ele trabalhava em um roteiro para uma história em quadrinhos sobre Aleister Crowley. Dada a maneira infame (e imprecisa) como os quadrinhos trataram Crowley no passado, naturalmente fiquei em dúvida. Mas Martin logo me convenceu de sua sinceridade, de sua fascinação com o assunto em questão e de seu desejo sério de fazer algo digno. Essas foram as mesmas razões pelas quais escrevi Perdurabo: The Life of Aleister Crowley (Perdurabo: A Vida de Aleister Crowley). Éramos almas parecidas.

A maneira como Martin me escrevia para checar alguns fatos mostrava seu comprometimento em colocar as coisas corretamente. Mais que tudo, amei suas perguntas: Como era a casa de infância de Crowley, “The Grange1”? Já tinha visto o Salão dos Mestres Maçons da Marca2? Como era o térreo do número 36 da Blythe Road3? AC e Rose fizeram sexo dentro da Grande Pirâmide? Como biógrafo, estava acostumado a pensar na vida de Crowley usando o lado direito do cérebro, fatos e palavras, e ali estava Martin me desafiando a interpretá-la visualmente e conjecturar o que havia acontecido entre fatos estabelecidos. Há muito penso que a vida de Aleister Crowley daria uma fantástica minissérie de TV. Foi grande demais para qualquer filme com ambições menores que a de Peter Jackson. A vida de AC foi um drama de época vitoriano/eduardiano. Tem viagens para terras exóticas, de Xangai, Índia e da Caxemira à Argélia, ao Egito e a São Petersburgo, até os Estados Unidos e o México. Seu elenco de personagens incluiu William Butler Yeats, Somerset Maugham e Auguste Rodin nos primeiros anos e depois Aldous Huxley, Alfred Adler e Ernest Hemingway. E o que esse cara não fez? Foi poeta, romancista, ensaísta e dramaturgo. Foi um alpinista que estabeleceu recordes em vários continentes, estando entre os primeiros a colocar os pés no Himalaia. Foi pintor. Foi ocultista praticante, e o líder de duas sociedades secretas, e o profeta de uma filosofia espiritual pertinente ainda hoje: “Faze o que tu queres, há de ser o todo da Lei”. Foi à paisana para Nova York lutar contra a máquina de propaganda alemã durante a Primeira Guerra Mundial. Experimentou drogas. Teve dramas sexuais e de relacionamento suficientes para envergonhar qualquer romance erótico. E do mesmo modo que os tabloides hoje publicam infinitamente reportagens grosseiras e duvidosas sobre a família real ou sobre Brangelina, AC foi o bode expiatório favorito da imprensa sensacionalista de seus dias. Seja o que for que se pense a respeito das ideias de Crowley, a vida dele foi indiscutivelmente épica.

No entanto, como a celuloide poderia transmitir os encontros de Crowley com anjos e demônios? Como representar suas conversas com Aiwass, o Anjo da Guarda Sagrado, Buer, o espírito da Goetia, Choronzon, o medonho guardião do décimo Aethyr, os magos Abuldiz e Amalantrah, e várias outras entidades existentes em planos mais altos de existência? A jornada espiritual de Crowley é o elemento mais importante de sua história de vida e, no entanto, o mais subjetivo e impressionista.

A história em quadrinhos – livre das amarras de elenco, locações e orçamentos para efeitos especiais, limitada apenas por palavras e tinta – é talvez o único meio que pode fazer justiça a essa jornada fantástica. Martin Hayes junta primorosamente o espiritual e o mundano, verdade e rumor, no que é por fim a história humana de uma das pessoas mais ambiciosas já nascidas. A arte de R.H. Stewart serve à história com brilho: desliza pelos limites da representação e da impressão, ocupando aquele espaço transicional entre apresentar os detalhes e deixar espaço para a imaginação. Para os que são familiarizados com as fotos, as artes e outras imagens do tempo de Crowley, Roy e Martin fazem um trabalho fantástico ao referenciá-las de modo inteligente ao longo do livro, transformando-as em uma caça ao tesouro divertida para os fãs mais ferrenhos. Esta é uma obra para ser saboreada e lida mais de uma vez.

Uma jornada incrível o aguarda, e espero que goste de Aleister Crowley. Eu? Como fã tanto do assunto quanto dos quadrinhos, sinto-me de novo como uma criança. Isso inclui os dois lados do meu cérebro.

Richard Kaczynski
9 de janeiro de 2013

 

*Richard Kaczynski  é autor de Perdurabo: The Life of Aleister Crowley.

  1. Nota da edição brasileira: Grange é a casa senhorial de fazenda, a “casa-grande”.
  2. NdEB: Mark Masons’ Hall, uma das principais lojas maçônicas de Londres.
  3. NdEB: Endereço da sede da Golden Dawn.

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