Veneta Entrevista: Gilbert Hernandez
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*Por Rômulo Luis
Um dos maiores pilares do quadrinho undergound mundial, Gilbert Hernandez começou a ganhar popularidade na lendária revista Love and Rockets, feita em parceria com seus irmãos Jaime e Mario. Foi nas páginas da publicação, originalmente um zine feito em casa, que surgiu a mítica Palomar, um vilarejo em algum lugar da América Latina habitado por um elenco de figuras pitorescas. As crônicas estão compiladas em três volumes: Sopa de Lágrimas, Diastrofismo Humano e Além de Palomar.
Gilbert é também nosso Autor da Semana e está com uma seleção especial de títulos e combos com preço promocional no nosso site, incluindo todos os volumes de Palomar! Você pode conferir a promoção aqui.
Diretamente de sua casa em Las Vegas, o artista concedeu uma entrevista exclusiva para o nosso blog, onde fala sobre as origens da Luba, as consequências de publicar quadrinhos há tanto tempo e até algumas recomendações de filmes!
Gilbert, primeiramente, obrigado por nos conceder esta entrevista. É uma honra poder conversar com uma lenda viva dos quadrinhos. Como você e sua família estão nessa quarentena? Vem trabalhando em algo novo?
Gilbert: Minha família está bem. Estou trabalhando nas próximas edições de Love and Rockets, Blubber e Psychodrama Illustrated. Sempre trabalhando em quadrinhos!
Rio Veneno, que acaba de ser lançado no Brasil na coletânea Além de Palomar, investiga as origens daquela que é na minha opinião a maior heroína na história dos quadrinhos. Quais foram suas inspirações na criação do Luba? Ela já nasceu com toda essa importância ou ficou tão grande que se tornou impossível ignorar esse protagonismo?
Gilbert: A Luba veio de todos os lugares: da ficção, da vida real e da minha imaginação. Quando muitos leitores a viram pela primeira vez, consideraram um clichê ou uma piada. Era meu trabalho humanizá-la, como se ela fosse real, e contestar ideias preconcebidas sobre como uma boa personagem deve ser.
A outra história que compõem Além de Palomar, “Love and Rockets X”, afasta-se da tradicional cidade latino-americana para um mergulho profundo na cena cultural da Los Angeles dos Anos 90. Você se lembra de algo em particular que motivou essa mudança de cenário na época?
Gilbert: Eu queria dar uma pausa na continuidade das histórias de Palomar. Então usei minha experiência de adolescente com música, amigos e pessoas com as
quais eu não me dava bem.
Uma das coisas que mais me encanta nas histórias de Palomar é como elas conseguem ser tanta coisa ao mesmo tempo. Rio Veneno, por exemplo: tem o realismo fantástico de sempre, mas também é uma história da máfia, com o estilo inconfundível dos clássicos do underground e algo muito íntimo que lembra um pouco uma novela ou aqueles quadrinhos românticos dos anos 50. Só posso imaginar que você tem um leque muito amplo de influências. Você poderia falar um pouco mais sobre elas?
Gilbert: Todas essas coisas que você mencionou! Eu nunca pensei nos meus quadrinhos como uma novela. As pessoas dizem muito isso, mas eu apenas vejo como ficção.
Você já pensou em se mudar para Palomar?
Gilbert: Palomar está em nossas mentes, em nossos corações. Ela está em todos os lugares e em lugar nenhum.
Depois da turma da Zap Comix, sua geração é definitivamente um dos grandes pilares que abriram o caminho dos quadrinhos underground nos EUA. Quando você abre uma HQ hoje, é comum encontrar influências do seu trabalho nela? E quais novos autores você recomendaria?
Gilbert: A principal influência da Love and Rockets é que hoje existem novos criadores fazendo quadrinhos que são pessoais e não criações de outras pessoas. Não costumo ler novos quadrinhos, então nem sei quem é bom.
Palomar está cheia de mulheres maduras, que viveram todas as complexidades da vida, que sofreram com a fome, tomaram decisões erradas, perderam filhos, lutam pela sobrevivência dos filhos que têm. Como um punk rocker em seus 20 anos poderia criar mulheres de tamanha complexidade? Quais são as suas influências e referências para essas personagens? Alguma mulher que você conheceu?
Gilbert: Com a Luba, eu queria ter a minha própria Scarlett O’Hara. A personagem do filme E o Vento Levou me inspirou porque as pessoas esperam que um personagem masculino fale por um artista masculino, mas isso não é muito interessante para mim. Se as mulheres tiveram que se identificar com personagens masculinos ao longo dos anos, por que os homens não podem se identificar com uma mulher?
Como um artista que se mantém altamente produtivo há tanto tempo, qual é a grande diferença entre publicar hoje e nos anos 80?
Gilbert: Quando começamos, quase não havia quadrinhos que tivessem um ponto de vista pessoal. A maioria só reutilizava personagens velhos, de propriedade da Marvel e da DC.
Em nenhum momento você deitou a cabeça no travesseiro e se arrependeu pelo destino que deu à Tonantzin Villaseñor?
Gilbert: Eu costumava sentir falta de escrever e desenhar a Tonantzin porque alguns personagens não podem ser substituídos. Agora ela é apenas uma memória distante. É isso o que acontece quando você faz quadrinhos há tanto tempo quanto eu.
Por fim, três filmes que você recomendaria pros fãs de Palomar.
Gilbert: O Quimono Escarlate de Samuel Fuller, Soberba do Orson Welles e Os Esquecidos de Luis Buñuel. Todos filmes VELHOS e em preto e branco.
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